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Projeto Conecta Cerrado: para conservação da biodiversidade e sustentabilidade do agronegócio.

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O Parque Vida Cerrado – primeiro e único centro de conservação da biodiversidade, pesquisa e educação socioambiental do Oeste baiano – deu início, recentemente, às ações do Projeto Conecta Cerrado: uma pesquisa inédita na região sobre o impacto da cadeia produtiva agrícola ao animal da espécie lobo-guará, que possibilitará a identificação da efetividade de corredores ecológicos e do potencial de conexão entre as áreas protegidas.
Para falar sobre este estudo de dinâmica da fauna, de grande importância para a conservação da biodiversidade e a sustentabilidade do agronegócio, a bióloga do Parque Vida Cerrado, Gabrielle Rosa, responsável pela liderança, coordenação das ações e monitoramento do projeto, concedeu uma entrevista à Revista Stylo Rural em sua última edição, que publicamos na íntegra em nosso site. O projeto conta com o apoio da Conservação Internacional do Brasil e do Instituto para a Conservação dos Carnívoros Neotropicais (Pró-Carnívoros), com transferência de expertise em captura e monitoramento de fauna. Acompanhe a entrevista.

Stylo Rural – Quais são os objetivos do projeto Conecta Cerrado?

Gabrielle Rosa – O projeto busca a conservação da biodiversidade no Cerrado do Oeste baiano e, consequentemente, uma maior sustentabilidade rural, através da recuperação de áreas prioritárias em longo prazo. Por meio da identificação da fauna e da dinâmica de deslocamento do animal da espécie lobo-guará, será possível identificar os possíveis corredores ecológicos e estimular a conectividade dos remanescentes florestais. Através desta iniciativa, procuramos estabelecer diálogos para implementação de políticas públicas e gestão de conhecimento, sobretudo, cumprindo com o nosso papel na geração e no compartilhamento de informações. Queremos ser agente de transformação positiva para o agronegócio e meio ambiente.

Stylo Rural – Em que fase o projeto está e quais são os próximos passos?

Gabrielle Rosa – O projeto teve início, oficialmente, ainda no mês de fevereiro deste ano, com a instalação das armadilhas fotográficas nas bordas e no interior de reservas legais de diferentes propriedades rurais de Luís Eduardo Magalhães e Barreiras. Agora estamos na etapa de observação e coleta de dados. Uma vez por mês, voltamos com a equipe técnica aos locais onde as câmeras estão instaladas para checagem, troca de cartões de memória e coleta de dados. Passado esse período de observação das imagens, faremos a captura de lobos-guará para coleta de sangue, avaliação do estado geral de saúde, colocação de rádios colares e posterior soltura desses animais nas áreas em que foram capturados. Dessa forma, poderemos acompanha-los em tempo real. Após todo esse processo, faremos o processamento de dados e iniciaremos as demais fases do projeto.

Stylo Rural – De que forma a observação do comportamento desses animais fornecerá dados importantes para compreensão da qualidade das áreas de conservação da região?

Gabrielle Rosa – A diversidade de fauna é um dado importante para esse entendimento. As áreas de conservação só cumprem o seu papel, integralmente, se de fato os animais também fazem uso dela. Se a fauna não está utilizando aquela área, significa que algo está faltando. A observação de atropelamentos de lobos na região sugere uma população significativa para a espécie e entender como eles interagem com a paisagem do Oeste da Bahia nos ajudará a compreender a necessidade de conectar fragmentos de vegetação. Em outras palavras, o comportamento dos animais na natureza vai nos demonstrar a real efetividade das áreas de conservação. Além disso, vai nos permitir identificar a fauna de médio e grande porte existente na região. Os lobos-guarás serão nossos “detetives ecológicos”. Através desta iniciativa, será possível avaliar a efetividade das áreas protegidas, identificar corredores ecológicos, apontar áreas com potencial para ampliação, restauração e criação de novas unidades de conservação, estimular a conectividade dos remanescentes florestais, implantar sistemas agroflorestais, estruturar e fortalecer a cadeia da restauração através dos coletores de sementes e da implantação e funcionamento de um viveiro de espécies nativas, disseminar o conhecimento técnico-científico obtido por meio da pesquisa, propiciar maior sustentabilidade às propriedades agrícolas e assegurar a conservação da biodiversidade do Cerrado.

Stylo Rural – O setor produtivo do agronegócio da região tem se destacado na busca pela sustentabilidade, haja vista a grande quantidade de dados e trabalhos que as entidades já detêm, tendo o Parque Vida Cerrado, inclusive, grande contribuição neste contexto. Faltava um estudo sobre a fauna para um panorama da realidade regional?

Gabrielle Rosa – Sim. Sempre foi um desejo a realização de uma pesquisa que nos fornecesse informações sobre a fauna. O que a gente observa é que há muita falta de informação sobre a fauna local e o status de conservação das espécies ameaçadas. Nós precisávamos saber de que forma a cadeia da soja, principal cultura da região, impacta a vida das espécies e como os conflitos rurais, causados pela desinformação, prejudicam animais e seres humanos. Também observamos que a região tem sofrido com o esgotamento de recursos, com áreas com notáveis perdas de solo, de recarga e de controladores biológicos. Isso tem exigido do produtor rural, o aumento de correções ao longo do tempo, o que tem encarecido o custo da produção. Por isso também é que temos um número cada vez maior de empresas biológicas na região, focadas no oferecimento de novas alternativas agrícolas. Também acreditamos que o modelo de agronegócio praticado, muitas vezes é insustentável, pois modelos de desmatamento e adequação rural não fazem análise de áreas prioritárias, sem falar da morosidade dos órgãos responsáveis. Por essa razão é que entendemos que há ineficiência das áreas restauradas. Há processos de floresta vazia, áreas recuperadas com poucas espécies, falta de viveiros na região e poucas informações sobre técnicas de restauração, de descobertas de processos alternativos e de insumos de qualidade na região. Se tudo isso reflete no campo, reflete também na vida animal.

Stylo Rural – Por que a escolha dos municípios de Luís Eduardo Magalhães e Barreiras para realização do projeto?

Gabrielle Rosa – O Parque Vida Cerrado está localizado no município de Barreiras, já na divisa com Luís Eduardo Magalhães. Estamos em posição estratégica, entre dois dos maiores centros de referência agrícola do Oeste da Bahia, onde se concentram as principais instituições ligadas ao agronegócio. Isso nos permite maior capilaridade nas ações. Desde a sua fundação, há 13 anos, o parque tem atuado nesses municípios na área urbana e rural, através de parcerias ou desenvolvendo projetos com outras empresas, instituições e poder público.

Stylo Rural – Além do trabalho em pesquisa e educação socioambiental, o parque também atua nos núcleos fauna e flora, que são alvos da pesquisa do projeto Conecta Cerrado. Como funciona a atuação do Parque Vida Cerrado na busca pela conservação da biodiversidade e pela sustentabilidade do agronegócio?

Gabrielle Rosa – O parque atua em três núcleos, identificados como comunidade, flora e fauna. No primeiro núcleo, atuamos na educação ambiental e buscamos o envolvimento da comunidade com o bioma local. Este trabalho se dá através de visitas de escolas e da comunidade ao parque e, também, por meio de oficinas e projetos diversos. Outra frente na qual atuamos é a fauna, com a manutenção de um criadouro conservacionista para pesquisa, proteção e reprodução de animais silvestres, que são enviados para programas de reintrodução em vida livre e, também, para instituições que mantém animais sob cuidados humanos com o objetivo de garantir a variabilidade genética da população. O parque mantém, atualmente, 28 animais em seu plantel, de dez diferentes espécies nativas, sendo cinco delas ameaçadas de extinção. O núcleo flora surgiu da necessidade de manter a vegetação nativa do cerrado no meio rural e promover a arborização urbana. Por isso, o parque mantém um viveiro de mudas, que serve de ferramenta de educação ambiental e, também, como fonte de mudas nativas para agricultores e instituições locais tocarem seus programas de recuperação de áreas degradadas. O viveiro, que já contabiliza a destinação de mais de 200 mil mudas em toda a região Matopiba, está passando por uma reestruturação completa nesse projeto para se transformar em um centro em excelência em restauração, aumentando a eficiência dos processos e reduzindo os custos.

Stylo Rural – Quem são os financiadores do projeto e como surgiu a parceria com o parque na realização do Projeto Conecta Cerrado?

Gabrielle Rosa – A iniciativa global “Parceria para o Bom Desenvolvimento (The Good Growth Partnership)” é um trabalho conjunto de seis agências implantadoras: Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), responsável pela coordenação geral; Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (UNEP); Corporação Financeira Internacional (IFC), do Banco Mundial; Banco Interamericano de Desenvolvimento (IADB); World Wildlife Fund (WWF) e Conservação Internacional (CI). No Brasil, a iniciativa global está atuando na cadeia produtiva da soja, na região do Matopiba, mais especificamente no oeste da Bahia e centro do Tocantins. Ele é executado pela CI-Brasil com o apoio de atores estratégicos dos setores governamentais, produtivo e da sociedade civil. A proposta prevê o uso de inovação tecnológica e inteligência territorial, para apoiar a tomada de decisão de produtores rurais, que queiram migrar para um modelo de produção agrícola mais sustentável e competitiva. O diálogo entre os atores é parte fundamental da proposta e o acesso às iniciativas locais que facilitem a ocorrência dos trabalhos. Com isso nasceu a parceria para realização deste projeto.

 

 

Entrevista concedida à Revista Stylo Rural e publicada na Ed. 39/2020.

Fonte: Vida Cerrado

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